Tive que me acostumar muito cedo com perdas. O único acontecimento do qual me lembro sobre minha infância foi à morte de meu pai. Certo dia, sentado no colo de minha mãe, o vimos andar ate o meio do quintal como se apenas observasse o dia. Trazia na mão meio litro de gasolina em uma garrafa pet e a derramou sobre a cabeça. Pegou no bolso da calça um isqueiro e antes de se acender, disse algo que nunca consegui lembrar. Era um aviso que me dizia que no fundo, nada na vida valia a pena. Eu tentava entender o recado enquanto ele queimava no quintal.
O único evento que me vem a memoria sobre minha adolescência se refere a minha querida mamãe. Depois da morte do meu pai ficamos rapidamente sem recursos e a beira da falência. De bico em bico minha mãe costumava juntar algum dinheiro. Mal dava para pagar a comida e a escola, que fui obrigado a largar mais tarde. Mas, algum tempo depois o desespero não podia mais ser tolerado e ela então resolveu se tornar prostituta. Lembro-me que mordiscava uma coxa de frango na varanda enquanto eu a ouvia gemer no andar de cima. Algumas vezes ela gritava. Morreu de sífilis algum tempo depois.
Sai de casa cedo, com dezessete anos e fui viver na rua.  Foram tempos difíceis e eu tive que vender droga para sobreviver. Eu não era tão ruim nesse negocio. Apenas tinha que ficar de olho caso algum policial passasse perto do meu ponto. Algum tempo mais tarde, aos dezenove anos de idade, e depois de algumas passagens pela policia, resolvi largar as ruas e me tornei ajudante de pedreiro. Era um serviço muito pesado e o salario que eu recebia era pouco, porem, eu agora já possuía uma casa para viver.
Esta bem, não era bem uma casa, era um quarto, no tijolo e sem reboco no lado mais pobre da cidade. Na cidade eles não gostam de pessoas humildes. Eles só gostam das pessoas pobres no natal, quando dão presentinhos e se sentem felizes por ajudar a melhorar o mundo. Sempre achei isso muito bonito.
Alguns meses depois fui promovido a pedreiro, pois já conhecia muito bem o serviço. Conheci uma garota muito bonita cujo nome era Marcia. Eu nunca tinha ficado com uma garota antes por isso em todos os encontros eu sempre ficava calado. Ela gostava mesmo era da minha carteira. Era uma garota de gostos muito refinados. Como recompensa ela transava comigo, mas no escuro. Nunca a vi nua realmente ate o dia em que eu a matei.
Nunca pensei sobre os motivos que me levaram a cometer aquele crime. Um dia eu apenas decidi que tinha que fazer algo em relação àquela mulher ou eu iria novamente parar na rua. Aproveitei-me de mais uma noite de bebedeiras com ela e batizei o seu copo com um sonífero comprado numa farmácia. Ela bebeu e começou a passar mal. Sonífero vagabundo. Carreguei-a no ombro com a promessa de que a levaria a um hospital. Coloquei ela dentro do porta-malas do carro e fui direto para casa. Chegando lá eu a retirei com o cuidado de observar se não havia por perto nenhum vizinho xereta.  Coloquei ela sobre a cama e amarrei firmemente suas pernas e braços com pedaços rasgados de lençol. Sentei em um banco ao lado da cama e enquanto ela dormia eu pensava no modo de concretizar meu serviço.
Decidi por fim que usaria uma faca. Fui ate a cozinha e escolhi a mais amolada. Retornei para o quarto, ela já abria os olhos e murmurava mesmo com a boca amarrada com trapos. Mais divertido pensei. Enquanto ela se contorcia de dor e chorava eu recortava seu fígado fora. Ela nunca mais iria beber com meu dinheiro. Não demorou muito para que acabasse morrendo. Passei as horas seguintes enterrando seu corpo, com cuidado para não fazer muito barulho, no quintal. Dormi tranquilo.
Durante a semana, vez ou outra eu ficava olhando para o local onde enterrei seu corpo, revivendo em minha mente todos os momentos sangrentos. Nas semanas posteriores eu ficava horas deitado na cama imaginando o sofrimento da vitima, entretanto com o passar do tempo a excitação foi acabando. Tornei-me taciturno novamente. Descobri que precisava daquilo como um viciado precisa da sua droga. Eu tinha que matar!
Resolvi que as melhores vitimas deveriam ser prostitutas. Vagabundas baratas que adoravam se divertir com dinheiro alheio. Então parti para minha segunda vitima. Seu nome era Suzanne. Eu a encontrei por acaso quando voltava do trabalho a noite. Estava encostada em um poste, provocante, divulgando seus dotes para o mundo inteiro. Seios fartos e empinados, corpo perfeito. Eu a odiei. E meu ódio me levou a contrata-la para uma noite de prazer. Uma noite do meu tipo de prazer, mortal, limpo, sangrento e grátis.
De inicio ao observar meu carro ela gracejou, pois achava que eu não teria os quinhentos reais que ela queria. Mostrei-lhe o dinheiro e odiei o brilho no seu olhar. Eu odiava tudo nela. Seu cheiro maravilhoso. Seu quadril perfeito. Enquanto dirigia para casa eu imaginava o melhor modo de matá-la, um modo que me desse prazer por muito tempo. Chegando em casa eu sabia exatamente o que fazer.
Levei-a para o quarto e a joguei na cama. A mesma cama onde minha querida Marcia faleceu. Ela começou a tirar a roupa e logo estava sentada sobre mim. Nesse momento acertei um soco na vadia que caiu de costas no chão, ela xingava e sangrava. Então a chutei na barriga e ela parou de xingar, pois estava sem folego, e ficou apenas sangrando no chão. Para me certificar que estaria desacordada ate a hora do show a soquei novamente e sorri ao ver que tinha finalmente desmaiado.
A garota acordou com o jato quente da minha urina em seu rosto. Tentou gritar e infelizmente não podia. Eu havia cortado sua língua e a coloquei em um cordão em volta do seu pescoço. Achei tão bonitinho que ate tirei uma foto. Eu tentei acalma-la dizendo que ela agora iria cumprir seu papel, pelo qual foi bem paga, que seria o de me dar muito prazer.
Fui a cozinha e tirei a panela de agua fervente do fogão. Sorridente, voltei ao quarto com a panela em mãos. Pela expressão da vitima ela certamente já sabia o que viria em seguida. Despejei o conteúdo da panela sobre o rosto da mulher e a observei se debater e sua cara se desmanchar quase que por completo. O que restou da sua beleza anterior se reduzira a carne inchada e hematomas grudentos.
Após algum tempo me aproximei dela e percebi que ainda estava viva. Ótimo. Levei-a nas costas ate o banheiro e a atirei na banheira encardida. Esta estava cheia de alguns litros de acido próprio para bateria, ela nem sequer gritou. Apenas ficou lá se desfazendo em um vapor sufocante e molho de tripas.
Durante vários dias novamente me senti realizado. Passava horas no trabalho revivendo passo a passo o maravilhoso prazer que tive com a prostituta. E a noite, ao chegar em casa observava a foto que tirei. Tomei o devido cuidado de guardar o cordão com a língua na geladeira, era um preciso troféu para minha coleção.
Das outras vitimas não tem muita novidade para contar. Apenas variei os métodos tentando alcançar plena satisfação sexual. Como no caso da pequena Beatriz. Ela não era prostituta era uma estudante secundarista. Às vezes sentando na varanda de casa eu a via passar com suas amigas. De todas era a mais safada. Gostava de usar saias bem curtas e sempre que me via lançava um olhar provocante. Eu odiava aquela garota.
Eu a seduzi na festa da igreja. Deliciei-me com seu corpo dentro do confessionário e lá mesmo eu a enforquei. Mas o fiz com tanta forca que vi seus olhos saltarem da orbita. Por algum tempo fiquei observando suas orbitas vazias pelas quais fluíam sangue e alguma outra substancia branca. Ela tinha apenas quinze aninhos, coitada. Retirei um dos olhos que havia caído em minha roupa e o guardei no bolso. Apressado sai sem olhar para os lados, não sei se fui visto, mas esse assassinato causou comoção geral na vizinhança e todos queriam poder se livrar do maldito assassino.
Há um mês mais ou menos foi quando as coisas começaram a desandar. Notei em minhas andanças que algumas pessoas me olhavam de forma esquisita. Fui tomado pelo pânico e comecei a imaginar quando me pegariam. Com certeza me bateriam de forma a esmagar meu crânio e enfeitariam a frente de minha casa com meu intestino grosso. Decidi que se fosse pego eles não teriam esse prazer. Comprei uma arma de segunda mão, raspada e durante alguns dias pratiquei tiro ao alvo em um lugar distante da mata. Eu odiava aquela arma. Não havia prazer algum em matar alguém com ela.
Fui obrigado a segurar minha ânsia por prazer durante algum tempo. Pelo menos desde o dia em que um policial bateu em minha porta. Suspeitava da movimentação estranha na minha casa e me perguntou sobre a Marcia. Estava viajando, menti, na casa da família. Essa explicação pareceu não convencer o guarda e eu tive que enfiar as mãos nos bolsos da calca, pois tremiam e suavam sem controle. Por sorte o policial foi alertado pelo radio sobre uma briga em um bar. Despediu-se com um estou de olho em você.
Mesmo após vários minutos da saída do policial, fiquei ali parado no mesmo lugar. Suando e tremendo. Somente uma ideia dominava minha mente e ela ficou ainda maior quando vi a fofoqueira da minha vizinha passar na rua me olhando com um olhar triunfante. Eu iria matar aquela velha.
Nunca havia matado uma velha antes, provavelmente não traria nenhum prazer. Entretanto por questão de sobrevivência ela seria minha vitima de numero sessenta. Esperei anoitecer e pulei o muro no meu quintal que dava para o quintal da velha. Por sorte ela era alérgica a cães e por isso não possuía um. A idiota tinha deixado à janela destrancada, fácil demais. Agora era apenas questão de entrar no quarto da velha e a enforcar com o seu próprio intestino. Mas nunca cheguei a realizar meu plano.
Quando já me aproximava da porta do quarto dela as luzes se acenderam e tudo em seguida foi rápido demais para eu acompanhar. No instante seguinte estava com a cara no chão.  Fui algemado e levado para a viatura em meio a xingamentos da população. Recebi uma pedrada na cabeça e fiquei meio zonzo. Na viatura fui vitima de mais espancamento e acabei desmaiando. Acordei nessa cela.
Uma senhora me viu sair do confessionário onde matei a estudante. Desconfiada resolveu investigar e vomitou no chão da igreja ao ver o corpo da menina. Teve medo de denunciar por algum tempo, porém um dia, encorajada pelo marido foi a delegacia e fez a denuncia. Armaram o bote, ate mesmo o chamado que o policial recebeu era falso. Eu não vi também que havia um carro estacionado na frente da casa da vizinha e que um homem que estava do outro lado do muro, no quintal dela, me observava friamente. O resto vocês já sabem.
Agora estou preso, não fui morto. Estou aguardando julgamento, porem meu julgamento já foi encerrado. Todas as minhas vitimas estavam ali comigo, com a mesma aparência que tinham ao morrerem. Elas me julgaram e sua decisão foi de que precisavam de mim junto a elas. Retirei o lençol da cama e amarrei um lado nas grades da janela e no outro fiz um laço que serviria para o meu pescoço.
Enquanto sufocava revia toda minha vida. Vi meu pai no seu momento derradeiro enquanto pegava fogo. Porem dessa vez foi diferente. Em chamas ele se dirigiu em minha direção e repetiu as palavras que não entendi naquele fatídico dia, e as palavras eram:
A morte não melhora ninguém...


Conto escrito por: José Brito / José Brito

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